Genética da obesidade: compreendendo os fatores hereditários
Publicado em 19/09/2024.
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A obesidade é uma condição médica complexa, caracterizada pelo acúmulo excessivo de gordura corporal, e que pode levar ao desenvolvimento de uma série de complicações de saúde e à piora da qualidade de vida.
Essa condição vem atingindo um número cada vez maior de pessoas em todo o mundo, independente do sexo e da idade, o que leva a questionamentos sobre suas reais causas.
Assim, embora fatores ambientais e comportamentais tenham um papel importante no desenvolvimento da obesidade, sabemos que eles não são os únicos causadores do problema, já que a genética exerce uma influência significativa.
Entender essa relação entre genética e obesidade, e de como cada gene pode aumentar o risco de ganho de peso, não é uma tarefa simples. Mas tentaremos aqui trazer o que há de mais recente nas pesquisas médicas sobre o tema.
A Influência genética na obesidade
O risco que a presença de alguns genes podem trazer, principalmente para o desenvolvimento da obesidade, é um campo de estudo que vem evoluindo rapidamente, e a cada dia novas pesquisas são iniciadas.
Alguns desses estudos científicos indicam que a obesidade pode ser altamente hereditária, e que entre 40% e 70% da variação no IMC (Índice de Massa Corporal) entre indivíduos pode ser atribuída a fatores genéticos1.
Isso se deve a mudanças em algumas das sensações relacionadas à alimentação e ao metabolismo, como o apetite, a saciedade, o armazenamento de gordura e a resposta aos exercícios físicos.
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Genes associados à obesidade
Vários genes podem estar associados à obesidade, e uma série de pesquisas já demonstram o impacto da genética tanto no ganho de peso quanto na resposta a tratamentos para obesidade.
Vamos agora conhecer os principais genes estudados:
- Gene FTO (Fat Mass and Obesity-associated): Esse é um dos genes mais conhecidos por sua associação com a obesidade, e está ligado ao aumento do IMC. Assim, a presença de duas cópias desse gene (uma herdada da mãe e uma do pai) aumenta a chance de desenvolvimento de obesidade1.
- Gene MC4R (Melanocortin 4 Receptor): O gene MC4R desempenha um papel fundamental na regulação do apetite e do gasto energético. Assim, mutações nesse gene podem levar ao ganho exagerado de peso e ao aumento do percentual de gordura corporal2.
- Gene LEP (Leptina) e LEPR (Receptor de Leptina): A leptina é um hormônio produzido pelas células de gordura que ajuda a regular o apetite e o metabolismo energético. Mutações no gene LEP, que codifica a leptina, ou no gene LEPR, que codifica o receptor de leptina, podem levar a uma deficiência ou resistência a este hormônio, levando a um aumento do apetite e ao ganho de peso3.
- Gene POMC (Proopiomelanocortina): O gene POMC também está envolvido no desenvolvimento da obesidade. Ele afeta a produção de melanocortinas, que são hormônios que regulam o apetite e o gasto energético. Por isso, deficiências ou mutações no gene POMC podem levar à obesidade precoce e severa4.
- Genes ADRB2 e ADRB3: Esses genes estão envolvidos na regulação do metabolismo, e podem influenciar a taxa de metabolismo basal e a eficiência com que o corpo queima gordura. No entanto, o papel exato desses genes ainda precisam ser melhor estudados5.
Existem ainda dezenas de outros genes sendo estudados por sua possível influência na obesidade e na perda de peso.
No entanto, nada disso substitui a necessidade de tratamentos efetivos para a obesidade, incluindo a cirurgia bariátrica.
Síndromes genéticas e obesidade
Além da influência causada por genes específicos, muitas vezes a obesidade está ligada a síndromes genéticas complexas.
Essas síndromes, são condições causadas por alterações nos genes ou cromossomos, frequentemente resultando em uma variedade de sintomas e problemas de saúde, incluindo a obesidade. Três síndromes notáveis relacionadas à obesidade são Prader-Willi, Bardet-Biedl e Cohen.
Outros sintomas dessas síndromes podem incluir a deficiência cognitiva e problemas em órgãos internos, como coração e rins, que tendem a ser piorados pelo excesso de peso.
Os tratamentos para obesidade em pessoas com essas síndromes muitas vezes envolvem abordagens multidisciplinares, incluindo controle nutricional, exercício físico e, em alguns casos, intervenções médicas ou cirúrgicas.
Epigenética e obesidade
A epigenética estuda as modificações químicas no DNA, que não envolvem alterações na sequência de genes em si6.
Essas modificações ocorrem por influência de fatores ambientais e de estilo de vida, como dieta e exposição a certos produtos químicos. Assim, essas mudanças podem afetar o risco de desenvolver várias condições de saúde, incluindo a obesidade.
Os mecanismos epigenéticos incluem:
- Ação de substâncias para ativar ou desativar genes.
- Mudanças em vias metabólicas para aumentar a absorção e reduzir o gasto energético, normalmente associadas a má nutrição na infância.
Desta forma, podemos ver que a genética afeta a obesidade de diferentes maneiras, incluindo depois do nosso nascimento.
Interação gene-ambiente
Embora os genes possam aumentar a chance de alguém desenvolver obesidade, a influência do ambiente no qual vivemos tem um papel essencial neste processo.
Fatores ambientais, como dieta e atividade física, podem aumentar ou amenizar a predisposição genética.
Por exemplo, uma pessoa pode não desenvolver a condição se mantiver uma dieta saudável e um estilo de vida ativo, mesmo que tenha os genes que levariam ao problema.
Resumo
A obesidade é uma condição complexa influenciada por uma combinação de diferentes fatores, sejam eles genéticos ou ambientais.
Entender a genética envolvida é essencial para desenvolver estratégias eficazes para a perda de peso, bem como para a prevenção da obesidade e suas complicações.
Mas nada disso tira a importância do correto tratamento para obesidade, como cirurgia bariátrica, mudanças alimentares, prática de exercício físico, entre outros.
1Frayling, T. M., et al. (2007). A Common Variant in the FTO Gene Is Associated with Body Mass Index and Predisposes to Childhood and Adult Obesity. Science, 316(5826), 889-894. doi:10.1126/science.1141634
2Loos, R. J., & Yeo, G. S. (2022). The genetics of obesity: from discovery to biology. Nature Reviews Genetics, 15(9), 584-598. doi:10.1038/s41576-021-00414-z
3Montague, C. T., et al. (1997). Congenital leptin deficiency is associated with severe early-onset obesity in humans. Nature, 387(6636), 903-908. doi:10.1038/43185
4Krude, H., et al. (1998). Severe early-onset obesity, adrenal insufficiency and red hair pigmentation caused by POMC mutations in humans. Nature Genetics, 19(2), 155-157. doi:10.1038/509
5Saliba LF, , et al. (2014). Obesity-related gene ADRB2, ADRB3 and GHRL polymorphisms and the response to a weight loss diet intervention in adult women. Genet Mol Biol. 2014 Mar;37(1):15-22. doi: 10.1590/s1415-47572014000100005
6Sharma, S., et al. (2017). Epigenetics in Obesity and Metabolic Diseases. Nature Reviews Genetics, 18(4), 293-309. Doi: 10.1038/s41392-023-01333-7