Cuide bem do seu coração

Publicado em 20/09/2022.

Tempo de leitura: 6.6 minutos.

A epidemia mundial da obesidade e a relação com doenças cardiovasculares como um dos maiores fatores de morbimortalidade nos preocupam, uma vez que os números só aumentam.

Conforme dados da VIGITEL (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico) de 2021, os índices de sobrepeso (57,2%) e obesidade (22,4%) sofreram progressão expressiva quando comparados aos resultados de 2020. Segundo o mesmo estudo do Ministério da Saúde, o diagnóstico médico de hipertensão arterial em 2019 era de 25,2%, passando para 26,3% em 2021.[1]Tiffany M Powell-Wileyet. al, Obesity and Cardiovascular Disease: A Scientific Statement From the American Heart Association. Review Circulation. 2021 May 25;143(21):e984-e1010[2]Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção de Saúde. Vigitel Brasil 2021: vigilância de … Continue reading

A obesidade e o excesso de peso se caracterizam pelo acúmulo de tecido adiposo (gordura corporal). Sua etiologia é complexa e multifatorial, resultante de variáveis como: fatores genéticos, psicológicos, socioeconômicos, culturais e ambientais. A obesidade é uma doença de saúde pública global e contribui fortemente para o aumento dos fatores de risco para doenças cardiovasculares (DCV).[3]Carel W le Roux, , Niels V Hartvig, Christiane Lundegaard Haase, Rikke Baastrup Nordsborg 3, Anne Helene Olsen 3, Altynai Satylganova. Obesity, cardiovascular risk and healthcare resource utilization … Continue reading Ressalta-se que dentre as doenças cardiovasculares relacionadas à obesidade destacam-se: acidente vascular cerebral (AVC), doenças tromboembólicas, infarto agudo do miocárdio, diabetes e hipertensão.

Na obesidade, observamos o aumento do tecido adiposo que, com o avanço dos estudos, sabemos que funciona também como um órgão endócrino produzindo adipocitocinas. As adipocitocinas e seus marcadores inflamatórios têm atuação direta com a resistência à insulina, complicações cardiovasculares, respiratórias, alteração no colesterol e doenças inflamatórias auto-imunes, levando o organismo do indivíduo obeso a um estado inflamatório crônico.[4]Oliveira, C., Brito, L., Freitas, M., Souza, M., Rêgo, J. and Machado, R., 2020. Obesidade: inflamação e compostos bioativos. Journal of Health & Biological Sciences, 8(1), p.1

No Brasil, das seis principais causas de morte, quatro estão diretamente ligadas à obesidade, sendo elas causadas por acidente vascular cerebral (AVC), infarto do miocárdio, diabetes ou hipertensão.[5]Nayla Cristina do Vale Moreira, Ibrahimu Mdala, Akhtar Hussain, Bishwajit Bhowmik, Tasnima Siddiquee , Virgínia Oliveira Fernandes , Renan M Montenegro Jr, Haakon E Meyer. Cardiovascular Risk, … Continue reading Desta forma, podemos afirmar que, mesmo na ausência de alterações, os indivíduos com obesidade ou excesso de peso têm uma maior probabilidade em desenvolvê-las quando comparados aos indivíduos de peso adequado, segundo a literatura científica [6]Opio J, Croker E, Odongo GS, Attia J, Wynne K, McEvoy M. Metabolically healthy overweight/obesity are associated with increased risk of cardiovascular disease in adults, even in the absence of … Continue reading [7]Leslie L Davis 1, Melissa Z Nolan. The Influence of Obesity on Care of Adults with Cardiovascular Disease. Nurs Clin North Am. 2021 Dec;56(4):511-525. doi: 10.1016/j.cnur.2021.07.002.

A aferição da circunferência abdominal é vista como um dos possíveis marcadores de riscos cardiovasculares pois, de maneira indireta, fornece uma ideia da composição corporal e adiciona informações importantes junto ao IMC (Índice de Massa Corpórea).[8]Yu E, Ley SH, Manson JE, et al. Weight history and all cause and cause-specific mortality in three prospective cohort studies. Ann Intern Med 2017; 166: 613–620 A quantidade de gordura presente no abdômen é um fator de risco para doenças cardiovasculares, independentemente se o indivíduo apresenta ou não alterações metabólicas.

Segundo pesquisas recentes, a obesidade na infância e adolescência teve grande aumento nos últimos anos, contribuindo para o risco de doenças cardiovasculares na idade adulta. Em vista disso, necessitamos atuar na intervenção precoce com tratamento clínico adequado, para impedir o avanço da obesidade e munir a população com informação sobre os riscos de doenças e a importância de uma vida saudável.[9]Kumar S, Kelly AS. Review of Childhood Obesity: From Epidemiology, Etiology, and Comorbidities to Clinical Assessment and Treatment. Mayo Clin Proc. 2017 Feb;92(2):251-265. doi: … Continue reading

O tratamento da obesidade é complexo e deve ser iniciado pelas mudanças no estilo de vida, como a combinação de uma dieta balanceada e a prática de exercícios físicos regulares para o controle do peso.[10]Sophie L. van Veldhuisen, Thomas M. Gorter, Gijs van Woerden, Rudolf A. de Boer, Michiel Rienstra, Eric J. Hazebroek, Dirk J. van Veldhuisen, Bariatric surgery and cardiovascular disease: a … Continue reading Em caso de falha na tentativa clínica, a realização da cirurgia bariátrica e metabólica torna-se a melhor alternativa para o controle da obesidade, e consequentemente, das doenças associadas.[11]Arterburn DE, Telem DA, Kushner RF, Courcoulas AP. Bene?ts and Risks of Bariatric Surgery in Adults: A Review. JAMA. 2020 Sep 1;324(9):879-887. doi: 10.1001/jama.2020.12567. PMID: 32870301 [12]Alves Farias de Melo, M., Dos Santos, T., Godoy, L., Silva, K., Mezzomo, T. and Rizzon Zaparolli, M., 2019. Efeito da redução de peso em pacientes submetidos à técnica do Bypass Gástrico em … Continue reading

Recentes estudos mostram que a cirurgia bariátrica e metabólica representa uma estratégia eficaz na redução da mortalidade por qualquer causa em 45%, já a incidência de infarto do miocárdio e insuficiência cardíaca diminuiu significativamente em 42% e 46%, respectivamente.

Em um estudo realizado em 2019, verificou-se que, em relação às comorbidades, todos os pacientes no pré-operatório tinham maior prevalência de hipertensão, representando 62%. Durante o acompanhamento de 6 meses de pós-operatório, no entanto, houve redução da prevalência para 36% dos pacientes. Após 6 meses de cirurgia já é possível notar considerável melhora no controle das comorbidades relacionadas à obesidade.

A cirurgia bariátrica não tem efeito apenas na perda de peso, mas também influencia positivamente na alteração da expressão de hormônios intestinais e aumento da sensibilidade à insulina. A cirurgia bariátrica e metabólica exerceu efeito protetor em todos os tipos de AVC, em particular no AVC isquêmico, com redução de 63% em relação ao tratamento médico isolado. Segundo o Conselho Federal de Medicina (CFM), na Resolução n.º 2.131/15, os indivíduos com comorbidades podem ter indicação para a realização da cirurgia bariátrica desde que tenham o Índice de Massa Corporal (IMC) maior que 35 kg/m².

Isso posto, conclui-se que a busca por um peso saudável e a adoção de um estilo de vida que envolva práticas regulares de atividade física e alimentação balanceada, são fatores que contribuirão para a minimização de riscos relacionados ao desenvolvimento de doenças cardiovasculares. A medicina atual dispõe de equipes transdisciplinares especializadas em tratamentos da obesidade e doenças metabólicas, e que são habilitadas para acolher e tratar esses pacientes em todas as fases – da prevenção até eventualmente intervenções cirúrgicas – reduzindo, desta forma, a morbimortalidade.

Referências

Referências
1 Tiffany M Powell-Wileyet. al, Obesity and Cardiovascular Disease: A Scientific Statement From the American Heart Association. Review Circulation. 2021 May 25;143(21):e984-e1010
2 Ministério da Saúde (BR), Secretaria de Vigilância em Saúde, Departamento de Vigilância de Doenças e Agravos não Transmissíveis e Promoção de Saúde. Vigitel Brasil 2021: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília (DF); 2022 Disponível em: https://observatoriodeoncologia.com.br/wp-content/uploads/2022/04/vigitel-brasil-2021.pdf
3 Carel W le Roux, , Niels V Hartvig, Christiane Lundegaard Haase, Rikke Baastrup Nordsborg 3, Anne Helene Olsen 3, Altynai Satylganova. Obesity, cardiovascular risk and healthcare resource utilization in the UK. European Journal of Preventive Cardiology, Volume 28, Issue 11, November 2021, Pages 1235–1241
4 Oliveira, C., Brito, L., Freitas, M., Souza, M., Rêgo, J. and Machado, R., 2020. Obesidade: inflamação e compostos bioativos. Journal of Health & Biological Sciences, 8(1), p.1
5 Nayla Cristina do Vale Moreira, Ibrahimu Mdala, Akhtar Hussain, Bishwajit Bhowmik, Tasnima Siddiquee , Virgínia Oliveira Fernandes , Renan M Montenegro Jr, Haakon E Meyer. Cardiovascular Risk, Obesity, and Sociodemographic Indicators in a Brazilian Population. Front Public Health. 2021 Nov 30;9:725009. doi: 10.3389/fpubh.2021.725009. eCollection 2021
6 Opio J, Croker E, Odongo GS, Attia J, Wynne K, McEvoy M. Metabolically healthy overweight/obesity are associated with increased risk of cardiovascular disease in adults, even in the absence of metabolic risk factors: A systematic review and meta-analysis of prospective cohort studies. Obes Rev. 2020 Dec;21(12):e13127. doi: 10.1111/obr.13127. Epub 2020 Sep 1. PMID: 32869512
7 Leslie L Davis 1, Melissa Z Nolan. The Influence of Obesity on Care of Adults with Cardiovascular Disease. Nurs Clin North Am. 2021 Dec;56(4):511-525. doi: 10.1016/j.cnur.2021.07.002
8 Yu E, Ley SH, Manson JE, et al. Weight history and all cause and cause-specific mortality in three prospective cohort studies. Ann Intern Med 2017; 166: 613–620
9 Kumar S, Kelly AS. Review of Childhood Obesity: From Epidemiology, Etiology, and Comorbidities to Clinical Assessment and Treatment. Mayo Clin Proc. 2017 Feb;92(2):251-265. doi: 10.1016/j.mayocp.2016.09.017. Epub 2017 Jan 5. PMID: 28065514
10 Sophie L. van Veldhuisen, Thomas M. Gorter, Gijs van Woerden, Rudolf A. de Boer, Michiel Rienstra, Eric J. Hazebroek, Dirk J. van Veldhuisen, Bariatric surgery and cardiovascular disease: a systematic review and meta-analysis, European Heart Journal, 2022;, ehac071, https://doi.org/10.1093/eurheartj/ehac071. Disponível em: https://academic.oup.com/eurheartj/advance-article/doi/10.1093/eurheartj/ehac071/6542137?rss=1&login=false
11 Arterburn DE, Telem DA, Kushner RF, Courcoulas AP. Bene?ts and Risks of Bariatric Surgery in Adults: A Review. JAMA. 2020 Sep 1;324(9):879-887. doi: 10.1001/jama.2020.12567. PMID: 32870301
12 Alves Farias de Melo, M., Dos Santos, T., Godoy, L., Silva, K., Mezzomo, T. and Rizzon Zaparolli, M., 2019. Efeito da redução de peso em pacientes submetidos à técnica do Bypass Gástrico em Y-de-Roux. Revista de Ciências Médicas, 28(1), p.11. Acesso em 10 de Agosto de 2022

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